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Sociedade empresarial: é possível a exclusão de sócio minoritário?

27/11/22

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por Miguel Teixeira Filho

O Código Civil, vigente desde 10/01/2003, introduziu no ordenamento jurídico brasileiro a possibilidade de exclusão de sócio (ou sócios), ou seu afastamento da sociedade, quando sua conduta está colocando em risco a própria empresa, mediante simples deliberação de sócios representando a maioria do capital social.

A previsão está expressa no artigo 1.085 do Código Civil, assim redigido:

Art. 1.085. Ressalvado o disposto no art. 1.030, quando a maioria dos sócios, representativa de mais da metade do capital social, entender que um ou mais sócios estão pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade, poderá excluí-los da sociedade, mediante alteração do contrato social, desde que prevista neste a exclusão por justa causa.

Parágrafo único. Ressalvado o caso em que haja apenas dois sócios na sociedade, a exclusão de um sócio somente poderá ser determinada em reunião ou assembleia especialmente convocada para esse fim, ciente o acusado em tempo hábil para permitir seu comparecimento e o exercício do direito de defesa.

Como se vê, a exclusão prevista no artigo 1.085 é de natureza extrajudicial, ou seja, pode ser deliberada pelos sócios sem necessidade de ação judicial, à vista de atos de inegável gravidade praticados pelo sócio.

É importante diferenciar “atos de inegável gravidade” com a mera “falta grave”. Os atos de inegável gravidade, a justificar a exclusão extrajudicial da sociedade, com suporte no artigo 1.085 do CC, são aqueles que colocam em risco a continuidade da empresa. Casos de falta grave também podem justificar a exclusão, a teor do que dispõe o artigo 1.030 do Código Civil. No entanto, nestes casos, será necessária a propositura de ação judicial específica.  

A deliberação de exclusão de sócio, como está expresso no art. 1.085 do CC, exige votos representando mais da metade do capital social (mais de 50%). Salvo se o contrato social dispuser diferentemente. Por exemplo: pode ser o caso que o contrato social contenha cláusula exigindo dois terços (2/3) dos votos para aprovação de exclusão. Neste caso valerá o que consta do contrato.

Além disso, para que a exclusão possa ocorrer por deliberação de sócios, valendo-se a maioria desta permissão do art. 1.085 do CC, é indispensável que haja cláusula no contrato social prevendo a exclusão de sócio por justa causa.  

No silêncio do contrato social, ainda que o fundamento da exclusão seja a prática de ato grave a ponto de colocar em risco a continuidade da empresa, será necessário o manejo de ação judicial.

Por qualquer das vias (exclusão mediante deliberação dos sócios ou exclusão por decisão judicial) sempre deverá ser provado que determinada conduta do sócio (ou sócios) é de tamanha gravidade que está colocando em risco a continuidade da própria empresa.

Pois bem.

Constatada a prática de ato(s) grave(s) por parte do sócio, que colocam em risco a continuidade da empresa e prevendo o contrato social a possibilidade de exclusão de sócio por justa causa (portanto, sem necessidade de ação judicial), deverá ser observado o seguinte procedimento:

1 - Convocação de assembleia de sócios, mediante aviso de convocação entregue a todos, com comprovação de entrega, constando no aviso a pauta a ser tratada, com clareza, ou seja: deliberação acerca de atos de gravidade, com possibilidade de aplicação da pena de exclusão.

2 – O aviso de convocação deverá ser entregue com razoável antecedência, dando-se conhecimento ao sócio dos atos que lhe estão sendo imputados (do que o sócio é acusado), para que este possa promover sua defesa. O Código Civil não prevê um prazo específico, mas pode ser ter como razoável antecedência para defesa um prazo de quinze dias úteis (por analogia com os prazos estabelecidos no processo judicial cível). 

3 – Na assembleia de sócios deverá ser assegurado ao sócio efetuar sua defesa, inclusive assegurado que possa se fazer acompanhar de advogado, se este desejar, tudo em face do que dispõe o artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal.

4 – Efetuada a imputação e promovida a defesa, a assembleia dará sua decisão, a qual terá que ser fundamentada, sob pena de nulidade.

5 – Aprovada a exclusão (por votos representando mais da metade do capital social, ou o quórum específico que eventualmente constar no contrato social), todos os atos e a decisão deverá constar em ata, a qual será assinada por todos o presentes. O sócio em julgamento tem direito a receber cópia da ata.

6 – Deliberada a exclusão, será lavrada alteração do contrato social, contemplando a saída do sócio dos quadros sociais. A alteração contratual poderá ser arquivada na Junta Comercial com ou sem a assinatura do sócio excluído.


Dissolução parcial da sociedade


A exclusão de sócio importa na dissolução parcial da sociedade, com apuração dos seus haveres, mediante levantamento de balanço de determinação do valor patrimonial das quotas, pagando-se o valor correspondente à participação do sócio excluído. O pagamento deverá ser feito em moeda corrente nacional, no prazo de noventa dias a partir da liquidação, salvo se houver outro modo previsto no contrato social.

A exclusão do sócio não o exime, ou a seus herdeiros, da responsabilidade pelas obrigações sociais anteriores, até dois anos após averbada no Registro do Comércio a resolução da sociedade que o excluiu.

Ampla defesa

Vale frisar que, nos termos do que consta do citado artigo 1.085 do Código Civil, e mais ainda do que emana do artigo 5º, inciso LV, da Constituição Federal, o direito de ampla defesa é imprescindível nas deliberações de exclusão. Não sendo facultado ou imposto óbices para o exercício da ampla defesa, o ato de exclusão pode ser anulado judicialmente, conforme se colhe de inúmeras decisões judiciais a respeito.

Exame judicial

Ainda que observados todos os requisitos exigidos pela Lei para a exclusão de sócio(s) por deliberação da maioria, por óbvio que a medida poderá ser questionada judicialmente, haja vista o princípio da universalidade da jurisdição previsto no artigo 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, o qual assegura que toda e qualquer questão possa ser levada à apreciação do Poder Judiciário.

O questionamento judicial, por exemplo, pode se dar na revisão da justa causa para a exclusão. Ou seja, submeter ao juiz se a conduta imputada ao sócio excluído de fato comprometeria a continuidade a empresa.

Como exemplo, cita-se decisão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, a qual invalidou exclusão de sócio porquanto não ficou demonstrado o requisito exigido pela Lei:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO ORDINÁRIA. EXCLUSÃO DE SÓCIO. CLÍNICA MÉDICA. CLÁUSULA EXPRESSA. AUSÊNCIA DE PROVA DA JUSTA CAUSA. IMPOSSIBILIDADE DA EXCLUSÃO. APELO PROVIDO.   Com o advento do Código Civil de 2002, para exclusão extrajudicial de sócio, passou a exigir o artigo 1.085:   (I) previsão no contrato social;   (II) deliberação da maioria do capital no sentido de que o sócio está pondo em risco a continuidade da empresa, em virtude de atos de inegável gravidade;   (III) assembleia especialmente convocada para esse fim; e   (IV) ciência do sócio acusado em tempo hábil para permitir o seu comparecimento e a sua defesa.   Contudo, não é qualquer descumprimento de obrigação contratual que legitima a exclusão do sócio.   A exclusão, por se tratar de medida de extrema gravidade, exige que o fato imputado ao sócio coloque em risco a continuidade da empresa, e seja capaz de romper o equilíbrio entre a colaboração do sócio e o objetivo comum estabelecido pela sociedade, para que se caracterize como justa causa. (TJSC, Apelação Cível n. 2010.048922-1, de Blumenau, rel. Janice Goulart Garcia Ubialli, Primeira Câmara de Direito Comercial, j. 08-12-2011). 

Por evidente que este texto contém apenas algumas linhas gerais sobre o tema, para fins de reflexão, não tendo valor como consultoria legal, sendo de todo recomendável que, deparando-se com tais situações, tanto a sociedade empresária, quanto o sócio atingido pela exclusão, procurem o assessoramento de advogado com atuação na área de direito empresarial para que todos os procedimentos legais e contratuais sejam observados, bem como os direitos das partes assegurados e preservados.


(*) Miguel Teixeira Filho é advogado em Joinville, sócio fundador da Teixeira Filho Advogados.

Autorizada a reprodução deste texto, desde que citado o autor e o link www.teixeirafilho.com.br

(Imagem: CanvaPro)

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